Rio Verde - GO
O incêndio do Cine Rio Verde (Memórias de um menino de Rio Verde)
Por Tadeu Nascimento
18:
45 horas do dia 29 de maio de 1964. O jovem Geovane revisava os rolos
de fita que seriam reproduzidos na tela do Cine Rio Verde. Naquele
tempo, havia racionamento de energia elétrica. Da Av.Presidente Vargas
acima havia energia até às 20 horas e o restante da cidade a energia
elétrica só era ligada, após as oito horas da noite. As sessões, nos
dias de semana, se iniciavam também as oito da noite. Geovane, como de
praxe, corria a fita com os dedos para se certificar se não havia algum
rasgo que comprometesse a projeção da imagem na tela do cinema.
Acidentalmente um rolo de fita encostou-se numa vela acesa sem que ele,
Geovane, percebesse. A fita, material altamente inflamável, fez com
que o fogo rapidamente se propagasse. Em poucos minutos a cabine de
projeção estava em chamas. Mas ainda não suficiente para chamar
atenção dos vizinhos ou de quem passasse por ali. Geovane não consegue
aplacar o fogo e sai às pressas com queimaduras em um braço. Alguns
minutos depois, ergue-se uma fogueira enorme. O Cine Rio Verde estava
totalmente em chamas!
Contava eu com 10 anos de idade e recuperando-me de uma caxumba, doença que hoje nem se fala mais. Morávamos na casa de minha avó, Tília Jayme Nascimento, enquanto meu pai construía a nossa casa. O referido cinema pertencia a minha avó materna. Com 39 graus de febre acordei-me com os gritos de minha avó e de minha mãe, desesperadas diante da tragédia. Levantei-me da cama assustado e vi o reflexo do vermelho da chama invadindo todo quarto. O prédio do cinema ficava na mesma rua, 5 terrenos após da casa de minha avó. Voltei-me o corpo para a janela que refletia o fogo: nunca vira tamanha fogueira. Aliás, já se passaram 48 anos e nunca vi outra de tamanha proporção. Em 1970, se a minha memória não estiver enganada quanto ao ano, vi um incêndio incomum na Av. Anhanguera com a Rua 6, Centro de Goiânia. Era uma loja de roupas masculinas. Acho que o nome da loja era San Remo. No entanto, não fora do tamanho do incêndio dantesco do Cine Rio Verde.
Contava eu com 10 anos de idade e recuperando-me de uma caxumba, doença que hoje nem se fala mais. Morávamos na casa de minha avó, Tília Jayme Nascimento, enquanto meu pai construía a nossa casa. O referido cinema pertencia a minha avó materna. Com 39 graus de febre acordei-me com os gritos de minha avó e de minha mãe, desesperadas diante da tragédia. Levantei-me da cama assustado e vi o reflexo do vermelho da chama invadindo todo quarto. O prédio do cinema ficava na mesma rua, 5 terrenos após da casa de minha avó. Voltei-me o corpo para a janela que refletia o fogo: nunca vira tamanha fogueira. Aliás, já se passaram 48 anos e nunca vi outra de tamanha proporção. Em 1970, se a minha memória não estiver enganada quanto ao ano, vi um incêndio incomum na Av. Anhanguera com a Rua 6, Centro de Goiânia. Era uma loja de roupas masculinas. Acho que o nome da loja era San Remo. No entanto, não fora do tamanho do incêndio dantesco do Cine Rio Verde.
Lembro-me muitíssimo bem que no dia 31 de maio, domingo, iria passar
na tela "Os dez mandamentos", grande sucesso de Cecil B. de Mille com
Charton Heston e Yul Brinner. Quis o destino, que o incêndio ocorresse
na sexta-feira e não no sábado ou domingo que tinham duas sessões. O que
poderia resultar em uma tragédia maior. Em suma: não morreu alguém.
Acontece que este cinema faz parte da minha história, da minha pobre biografia. Desde pequenininho, eu frequentava cinema. O prédio do cinema era como mais um cômodo de minha casa. Minha avó Tília trabalhava na bilheteria (com a sua caçula Rafaelita no colo) e meu pai (para aumentar a renda da família) era dono da bomboniere do mesmo cinema. A minha infância foi muito focada nos astros hollyoodianos como Tarzan, Zorro, Robin Hood, Hércules e também pelos nossos heróis da Antlântida Filmes como Grande Otelo, Ankito, Mazzaropi, Zé Trindade ...
Em meio a tanta confusão entre o desespero em face do prejuízo e o socorro para apagar o fogo, assisti uma cena que nunca esqueci: a solidariedade do povo de minha terra. Duas longas filas onde, de mãos em mãos, passavam-se dezenas de galões e baldes com água para controlar o fogo. Algumas pessoas se queimaram nos braços, nas pernas em gestos heróicos para evitar que se alastrasse o fogo para as casas vizinhas. A luta contra as chamas durou-se a noite toda. Todavia o cinema queimou-se por inteiro, restando apenas uma de suas paredes. Levaram-me para casa do Dr. Alcyr Mendonça. Na casa de minha avó era impossível dormir. Na manhã seguinte, fui ver o que restou: somente carvão. Nada mais. Foi como se tirassem um pedaço de mim. Na casa de minha avó, a tristeza de um velório.
Acontece que este cinema faz parte da minha história, da minha pobre biografia. Desde pequenininho, eu frequentava cinema. O prédio do cinema era como mais um cômodo de minha casa. Minha avó Tília trabalhava na bilheteria (com a sua caçula Rafaelita no colo) e meu pai (para aumentar a renda da família) era dono da bomboniere do mesmo cinema. A minha infância foi muito focada nos astros hollyoodianos como Tarzan, Zorro, Robin Hood, Hércules e também pelos nossos heróis da Antlântida Filmes como Grande Otelo, Ankito, Mazzaropi, Zé Trindade ...
Em meio a tanta confusão entre o desespero em face do prejuízo e o socorro para apagar o fogo, assisti uma cena que nunca esqueci: a solidariedade do povo de minha terra. Duas longas filas onde, de mãos em mãos, passavam-se dezenas de galões e baldes com água para controlar o fogo. Algumas pessoas se queimaram nos braços, nas pernas em gestos heróicos para evitar que se alastrasse o fogo para as casas vizinhas. A luta contra as chamas durou-se a noite toda. Todavia o cinema queimou-se por inteiro, restando apenas uma de suas paredes. Levaram-me para casa do Dr. Alcyr Mendonça. Na casa de minha avó era impossível dormir. Na manhã seguinte, fui ver o que restou: somente carvão. Nada mais. Foi como se tirassem um pedaço de mim. Na casa de minha avó, a tristeza de um velório.
As imagens
da televisão ainda não haviam chegado a Rio Verde. As únicas casas de
diversão eram o Cine Rio Verde e o Cine Bagdá. No dia seguinte ao
incêndio, meus tios se reuniram para definir o que fazer com o resto
que sobrara do cinema, ou seja, com o terreno vazio que ali ficou.
Decidiram construir um novo cinema. Sete meses depois, em 31 de dezembro
inaugurava-se, com grande festa, o novo Cine Rio Verde com o filme "Os
dez mandamentos". Quatro anos depois a minha família construiu outro
cinema, o Cine Presidente, na Av. Presidente Vargas. Mas depois
chegaram as transmissões de televisão e quase todos cinemas de rua em
todo planeta fecharam suas cortinas encerraram suas portas. Salas de
cinema com qualidade, só nos shoppings centers.
30 anos depois deste incêndio, assisti o filme Cinema Paradiso, de
Giuseppe Tornatore/1988. Ganhador do Oscar, versão melhor filme
estrangeiro.O enredo se passa numa pequena cidade da Sicilia,
Itália, antes da chegada da televisão, onde um menino,Totó (Salvatore
Cascio), se apaixonou por cinema e tornou-se amigo do progecionista,
Alfredo (Philippe Noiret, o mesmo ator de "O poeta e o carteiro") e
que, num certo dia, viu o prédio do cinema arder em chamas. E ele
chorou...Mas essa história aconteceu comigo!- me surpreendi. Aquele
menino da ficção sofreu o que eu sofri na vida real, ao ver desaparecer
nas chamas um mundo mágico de uma sala de progeção, que é a arte
do cinema. A arte que encanta o mundo inteiro.