domingo, 18 de dezembro de 2011


Lira de um menino de Rio Verde

Por Tadeu Nascimento

Na minha terra existe uma praça com 5 imensas palmeiras (imperiais) plantadas há quase 50 anos. A praça leva o nome de Major Frederico Gonzaga Jayme. A minha terra é Rio Verde. Lembro-me bem quando foram plantadas por um funcionário da prefeitura, um velho (e mal humorado) italiano de olhos azuis de nome Palastrino, na administração de Paulo Campos. Acredito que elas vingaram, graças a braveza do italiano que as protegia das traquinagens da molecada. Imagino que elas alcançam uns 12 metros. Em meio as suas palmas existem uma colônia de araras e outra de periquitos. Elas vestidas de amarelo-azul, eles de verde-verde. Tais como a bandeira nacional. Diariamente, quando a aurora lança suas cores no horizonte e quando o sol se desbota na outra vertente, as araras cortam o céu- exibindo seus vôos de liberdade sobre a rua, onde me vi crescer. Cumprem um trajeto de 45º de longitude, rasgando o céu- como se voassem para Goiânia à tarde e voltassem no outro dia com os primeiros raios da manhã. Mas, na verdade, a viagem é bem mais curta: vão dormir aos pares (elas são monogâmicas, ou seja, nunca cometem "adultério"!) em outras palmeiras mais jovens, as da AV. Presidente Vargas. Esse aero-caminho de ida e vinda de todos dias, passa sobre a casa da minha vida, a casa de meus pais. Enquanto as araras gorjeiam em pleno vôo, os periquitos se reúnem na beirada do telhado da casa de minha história, numa algazarra alegre (como se estivessem num boteco), para "por o papo em dia". Tento decifrar suas "conversas". É como se eles, os periquitos, discutissem sobre a minha presença naquela casa: "Quem é esse cara que acabou de chegar?" Responde outro periquito: "É o primogênito do Prof. Clóvis, que era o dono da casa, falecido há 6 anos! "Ele se parece com a mãe dele, Dona Zaira, lembra-te dela?" Como ela era brava, aliás era a mulher mais brava do mundo! Uma leonça! Tinha um enorme ciúme do Prof. Clóvis e ele, liso, escorregadio como enguia, dominava a fera! Conheceste o prof. Clóvis? Era um homem calmo, lia muito e adorava uma cervejinha! Pois é, viveram juntos por mais de 50 anos! Ambos, pessoas boníssimas que estão fazendo muita falta!" Enquanto isso, as araras com seus gorjeios me enviam em pleno vôo, uma mensagem, um "avegrama", como diria Vinícius de Moraes no seu poema "Patriazinha": "Tadeu, um dia vais voltar pra sua patriazinha que é Rio Verde e dela, nunca mais vais sair!..."
A Praça dos Coqueiros, como é conhecida, tem alma assim como as praças dos grandes romances. Praça que por muitos anos serviu de espaço para circos e festas juninas: palco de minha infância. Praça dos tilintares das bolinhas de gude, dos peões a rodopiar e das pipas no céu (que chamávamos de raias). Praça dos meus amigos Laurinho e Marcinho Campos, Leão (Pedro da Silveira), Nasir, Jerry e Barchira Okde (filhos de Hasse Okde), Adalberto "Moita" (por onde anda você?); do Aparicinho Toledo e de seus irmãos "Carretel" e Érica; do Zaga (Luis Gonzaga Cruvinel), hoje no TCE-GO; do Clóvis "Picolé" Guimarães (hoje em Cuiabá). Do Emilinho Baylão e do gordinho de calças curtas Emilinho Hannun (hoje, funcionário da Saga Veículos, em Goiânia).
O tempo viaja rápido demais. O ontem está ficando velho demais. E quanto ao hoje, eu com os cabelos gris, quando vou ao meu chão natal, passo pela "praça dos Coqueiros", miro o lábaro estrelado, o mesmo pedaçinho de céu, que agora é governado pelos periquitos verdes-que-te-quero-verdes e araras ouro-anis, me vejo menino lançando ao céu imensas pipas que a minha mãezinha encomendava ao Ozorinho Arantes, hoje publicitário de renome em Goiânia. E ele as fazia com maior esmero. Eu, dentro de minhas calças curtas, controlando a pipa com linha grossa e carretilha de madeira apoiando contra o meu corpo. E lá, no teto do mundo uma dezena de outras pipas disputando espaço e beleza. No chão da praça, as palmeiras, ainda pequenas, se erguiam para o céu, assim como eu para vida. Minha mãe me via feliz e isso- me lembro bem- deixava-a mais feliz ainda. Ah, que saudades do amor de minha mãe! Décadas se passaram e as palmeiras estão frondosas e eu, aqui, me desgastando com o tempo.
Sentado à mesa, ao ar livre, do "Quinta Essência", olho para os 4 cantos da praça, para as 5 palmeiras, para o azul infinito, me dá vontade de inverter a lógica do tempo e pedir ao nobre garçom 2 chopes; um pra mim e outro para o meu mais querido parceiro, meu pai. E repetiria muitas vezes: "Garçom, por favor, mais 2!" Mas ele não está ali. E nunca mais vai compartilhar um chope comigo. Um vazio enorme enche meu peito. Vem a vontade de chorar. Eu sei que esse é o preço que pagarei (sempre) por ter vivido dias felizes. Não tenho como impedir a lágrima que cai.
Ah...Palmeiras de minha praça, se soubesses de minha saudade... chorarias também.

3 comentários:

  1. REGINA CRUVINEL GUIMARAES22 de dezembro de 2011 às 04:04

    TADEU MEU AMIGO ..PARABENS PELAS SUAS PALAVRAS,TEMOS ORGULHO DE SERMOS RIOVERDENSES BJUSSSSSSSSSSSSS

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  2. Tadeu... ó quantas saudades, daqueles momentos que passamos na praça, vc o Telmo, o Picolé, o Emilinho da caraja, o Bertinho filho do Sr. João ataides, Aparicinho,carretel, o indês... são tantos que ficaria o dia todo lembrando das perpécias que fazia... quando estava jogando bete em frente o Hospital... e estava na defesa... ai gordinho buscar a bola perto do cemitério... era uma agonia. Mas foi tudo de bom que aconteceu... Hoje tenho a alegria de ter meus pais.. mas sei que a perda é muito grande e insubstituível... mas temos que tocar em frente..
    Um beijo no coração
    Emilinho Hanum.

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  3. Nossa!. Parabéns cara..
    Amei a sua narração..
    Ficou maravilhosa...!
    Sucesso para você!

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