terça-feira, 20 de dezembro de 2016


A felicidade morava no Córrego do Sapo


    Por Tadeu Nascimento

                  Menino sonha mais acordado do que dormindo! E desde que eu sonhava sob as influências, mais do sol do que da lua, já se passaram muitas décadas! Tempo que a felicidade tomava conta de mim! Hoje, quando sonho (e se me lembro desse sonho), é só nas horas noturnas! Sonho de menino é modesto, mas belo! E enquanto eu menino sonhador, eu viva onde reinava a liberdade, que era a única lei! E essa liberdade, se realizava quase todos os dias, principalmente nas férias. Época de aventuras de nadar no Córrego do Sapo, no poço chamado Matinha- que não era poluído- onde hoje é o lago do Clube Campestre em Rio Verde. Era natural voltar todos dias para aproveitar o máximo as férias que se passavam com a velocidade do vento!  Outra grande alegria era pescar lambaris e bagres naquele córrego, que para mim era o mar dos meus sonhos (eu que não conhecia o mar!), nos altos dos meus 12 a 14 anos! Ainda não havia o Clube Campestre! A felicidade estava justamente na inexistência do verbete "preocupação" que hoje me persegue, me domina o tempo todo e é a causa da minha insônia!
                  Mas, esse sonho não era exclusividade minha! Advogados, engenheiros, médicos, dentistas, políticos, figuras importantes que compõem o belo quadro social de Rio Verde deste milênio- e do finalzinho do outro-, também mergulharam nas águas seculares do Córrego do Sapo! É só perguntar, numa roda de bar, quem é que não tomou banho, inclusive pelado, no Poço da Matinha, ou em algum outro poço do Córrego do Sapo, nos fins dos anos sessenta do século que virou a página!
                  Meu pai fazia de conta que não gostava das minhas peripécias, mas sabia que era coisa de menino. Meu primo, hoje o médico Leonardo Pincovisk Ribeiro contava com  motorista próprio, seu pai, Jesus da Lapa Ribeiro (Lita Ribeiro) que ia buscá-lo no seu jeep Willys quase todas as tardes! Nós, simples mortais, voltávamos para casa de "dedão", pois era preciso  aproveitar até o último raio do sol no pequeno Poço da Matinha!
                  Todavia, era um espaço democrático. Quase sempre compartilhávamos o poço com a "Turma do Cabaré" que eram meninos mais pobres, porém valentes, que vivam na parte norte da cidade, lá para as bandas das "casas das mulheres alegres que  iludiam homens tristes"! Mas no final, nos entendíamos bem! Até porque, do nosso lado, havia o Demerval Brito Filho, filho de coronel da polícia, então, com quase 1,80 m de altura e que era um negão imbatível que ninguém encarava! Anos depois, Demerval foi prestar o serviço militar em Brasília, onde ficou famoso por ter sido um temível boxeador!
                   Nunca aconteceu um acidente grave; no máximo alguns arranhões, farpas nos pés  ou alguns calombos, preço barato para uma diversão de uma puberdade sadia! E não raro, alguma cobra distraída, cruzava o caminho, mas como é sabido "Deus protege os bêbados e as criancinhas"! Dos trampolins que se faziam os galhos de árvore, saltavam pobres, ricos e remediados! E o mais engraçado é que todos éramos tão iguais que nadávamos pelados, alguns de cuecas, e não havia lanches, nem refrigerantes que causassem diferenças entre uns e outros.
                   Após a ponte da descida para o Clube Campestre, lado direito, havia um alagado, pertencente as águas do Córrego do Sapo, cheio de tilápias. Tulio Jayme (Tulinho do Marinho), filho de Marinho Jayme- este, também pescador e caçador e emérito jogador de damas- com suas pernas e mãos atrofiadas tinha um acordo de cavalheiros  com os peixes: ele lhes servia quirelas de milho e em troca, os peixes abocanhavam os seus anzóis! E ele voltava pra casa com a capanga repleta de peixes! E nessas aventuras íamos, os três, Tulinho, Emilinho (Emílio Hanum Filho, ex-funcionário da Saga em Goiânia) e este escriba. Todos armados até os dentes com estilingues pendurados no pescoço! E nessas empreitadas, com a trilha sonora do vento e o cantar dos passarinhos, íamos felizes, como se não existisse maldade no mundo (enquanto isso, lá do outro lado do planeta, explodia a Guerra do Vietnã!) E era quase certo que lá estaria o Teleco (Eduardo Costa), irmão do "Gentil da Relojoaria". Esse garoto, foi o maior pescador de lambaris e lobós que eu já vi! Enchia duas capangas  de peixes, que trazia atravessada no corpo! Era lançar a linha e puxar! Então havia sempre disputas entre Teleco e o Tulinho! Duas forças poderosas! Duelo de Titãs! Mas, ao final, acho que o Teleco foi o maior!
                   Nessa pequena homenagem que presto ao Córrego do Sapo que me proporcionou os momentos mais felizes da minha puberdade, homenageio também esses personagens reais e importantes da minha vida! Tulinho Jayme já se foi ao encontro do Altíssimo. Teleco, pelo que me contaram (eu não sabia!) mora no "Abrigos dos velhos" em Rio Verde (irei visitá-lo quando estiver na cidade!) Emilinho reside em Uberlândia e trabalha, como sempre, no ramo de automóveis! Leonardo continua na sua nobre profissão de salvar vidas. E o Demerval, pelo que sei, reside em Goiânia. Todos grandes amigos e mais do que isso, inesquecíveis!
                      "Todo menino é um rei/ Eu também já fui rei/ Mas, quá, despertei/... Menino sonha com coisas/ Que a gente cresce  e não vê mais!"

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