quinta-feira, 29 de setembro de 2011


John Lennon e Mike Jagger

Sou um daqueles garotos que amavam os Beatles e os Rolling Stones


Por Tadeu Nascimento


"O passado é uma roupa velha que não nos serve mais", nos lembram versos de uma canção do cearense Belchior. Tudo bem, mas depende do ponto de vista. Do ápice da montanha da saudade, a visão do passado nos servem muito bem! Quando nos olhamos nos álbuns de fotografia, vemos o quanto éramos bregas. Aliás, as palavras brega e cafona surgiram naquela época. Época das mudanças: 1968 a 1978. Anteriormente, para se referir a alguém fora de moda, dizia-se que a pessoa era démodé, antiquada, de mal gosto, deselegante etc. Época em que os rapazes se vestiam com calças boca de sino, camisetas esbirradas, sapatos de saltos altos e sem meias, cintos largos com fivelões, e o mais chocante: os cabelos descendo pelas omoplatas. Elas, com mini saias tão curtas que qualquer poça d'água refletia suas delícias anatômicas. E, no entanto, nos achávamos o máximo! Quem se vestia ao contrário era quadrado! Naquele tempo, não se exibia os cofrinhos, mas as mini blusas denunciavam os umbiguinhos e as curvas da cintura; os vestidos curtos provocam imaginações interessantes... Não se usava tatuagens e os bíceps eram normais. Barriga de tanquinho era somente uma parte da anatomia feminina de quem exercia a honrada profissão de lavadeira. Homem usando brinquinhos, só em filmes de piratas. Dançávamos o rock e também de rostos colados. Diferentes do punk, do than, da dança da garrafa e de outras malemolências eróticas-imbecís, com músicas (e letras) mais imbecís do que eróticas que incomodam qualquer inteligência mediana.
Acontece que o passado sempre está fixo. Seja nos álbuns de fotografias ou nas nossas lembranças. O futuro, ao contrário, é tão amplo quanto incerto e não cabe nas nossas mentes. Rapazes com cabelos compridos eram seres tão modernos quanto aos de hoje que usam tatuagens. Usar calças com boca de sino era tão comum quanto usar calças de cós baixo, reveladoras de segredos dos cofrinhos das gatinhas nesse inicio da segunda década deste milênio.

Todavia, cabelos longos eram sinônimo de rebeldia. Os conservadores nos olhavam com desdém, quando não nos acusavam de vagabundos. Até porque, ficávamos mais expostos do que os jovens de agora, pois andávamos, quase todos a pé. "Cabelos longos, idéias curtas"!, "Rebeldes sem causa!"- denegriam-nos, os conservadores. O fato é que nós os incomodávamos muito. E nós os chamávamos de trogloditas ou de caretas. Pouco se falava ainda em drogas, isso até por volta de 1975, quando elas chegaram como praga social. A polícia, naquele tempo de fusquinha, fazia questão de nos encher o saco. Tínhamos que portar documentos, principalmente a carteira de trabalho, sob pena de passear na delegacia. No interior do país, havia muitos delegados que- por pura maldade- faziam questão de raspar as cabeças dos playboys cabeludos que ousavam passear nas cidades de suas jurisdições, nas férias. Além da estampa irreverente, havia o rock and roll que irritava a velha guarda que se orgulhava da trilha sonora de suas vidas que eram arcaicas quantos são trágicos os tangos de Gardel. Os tons saiam graves nas vozes de Nelson Gonçalves, Vicente Celestino, Carlos Galhardo e de outros melodramáticos. As músicas deles se agonizavam diante das novidades dos Beatles e dos Rolling Stones. As campanhas contra a guerra do Vietnam e a bandeira do sexo livre faziam com que os conservadores- que para nós- ainda estavam na era da pedra lascada- tivessem pesadelos. O sexy livre que imaginávamos não é este do "fiquei com ela ontem e hoje já estou com outra", mas sim o sexo livre para o amor. Maior exemplo disso era o amor do casal Jonh Lennon e Yoko Ono. Nas telas dos cinemas rodavam Romeu e Julieta...nus como o amor é absoluto. E a música do filme "A time for us" estourava nas rádios nas vozes de Johnny Mhatis e Andy Willians. Enquanto na vida real, demorava-se meses para levar uma garota para cama, isso quando acontecia.

Demorou um tempão para aceitar-nos sem reservas. Mas tempo foi passando e, aos poucos, aceitaram-nos e até alguns se aderiram aos cabelos cumpridos.

Embora bregas aos olhos de hoje, fomos felizes. O mundo pelo qual "brigávamos" era o da paz. Queríamos o fim das guerras, das desigualdades, da Kun Kux Klan, do Apartteid na África do Sul. O mundo que hoje vivemos está muitíssimo longe do ideal, mas conseguimos passos importantes. A democracia como fato consumado no ocidente, principalmente na América Latina e no Leste Europeu e a rebeldia contra as guerras (que ainda, lamentavelmente, persistem) cuja máxima ficou pra história: "Faça amor não faça guerra!" são frutos da rebeldia dos cabeludos que amavam os Beatles e os Rolling Stones. E ainda os amam. E muito.

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