domingo, 4 de outubro de 2009













A última flor do Lácio e seus espinhos

Por Tadeu Nascimento

Sempre quis entender o porquê das invasões bárbaras de palavras estrangeiras na última flor do Lácio, inculta e bela que é a nossa língua. Não venham me dizer que as invasões são porque ela é inculta (apesar de bela). Infelizmente aceitamos estas ingerências passivamente. Com isso, às vezes, me sinto alienado ou alienígena nesse mundo cheio de modernices. O estrangeirismo começa logo cedo, quando a gente acorda: para escovar os dentes usamos o “Close Up (antigamente era o Kollynos, o do sorriso). Melhor seria se usássemos o dentifrício, que é a palavra naturalmente brasileira. Nunca entendi o tal Close Up, se close em inglês significa fechado. Deve ser pra gente ficar com boca de siri. Abro a janela em busca de ar puro e deparo-me com um “outdoor” com a propaganda da “Pizza Hut”. Penso com tristeza: estão engolindo nossa língua rapidamente. Sem degustar. Nunca convivemos com tantas palavras estrangeiras! Certa vez, uma amiga me deixou constrangido por eu não saber o que era fazer “check in” (no aeroporto). Claro, eu quase só viajo montado nos – não sei em quantos – cavalos do meu automóvel!

– Ah, não vai me dizer que você não sabe o que “check in”? – com cara de decepcionada comigo (tipo: este cara não é deste mundo ou é um tremendo ignorante!)

– Não, não sei – respondi revelando a minha santa ignorância sobre tudo que é moderno. Falei cá com os meus distraídos neurônios: não teria outro nome em português equivalente a este infinitivo tão mal colocado do verbo fazer? A gente faz “check in”? Isso meu pai não me ensinou, nem o emérito professor de Português Sherlock Holmes da Silva no Colégio Martins Borges, em Rio Verde. Neste caso, não ficaria melhor o termo “Confirmação de voo” (para voar)? Exemplo: “Vou à confirmação” ou “Vou confirmar o voo”. Se não colar ou se não decolar, que inventem outro termo mais adequado. Em português, obviamente.
No início do século XX era o francês (galicismo), agora é o inglês (anglicismo). E os termos importados não param de nos contaminar. Com o advento do computador, criou-se um novo idioma, tanto que já inventaram o dicionário de informática. O que seria fazer um dowload? – perguntava a mim mesmo diante de alguém que falava o informatiquês. Até então, na minha família, ninguém fez dowload. A gente é pobre, mas é limpinho! Continuo a me indagar: melhor não seria baixar? Baixar alguma informação, assim como no centro espírita, embora as mensagens de lá sejam do outro mundo? Link? Só vim saber o que é este tal de link depois que o Google disse aos seus discípulos: é só procurar no “Cadê”! Conclui-se que “agenda” (no contexto, cibernética) seria a melhor denominação para a palavra link. Você tem “e-mail”? Quando surgiu o tal do “e-mail”, pensei que o mundo estava ficando tantã e meio. O dono da livraria ao telefone: “Me passa o seu e-mail”! Pensei comigo: esta deve ser uma nova modalidade de assalto! Ele quer que eu passe um e-mail pela linha do telefone! Não passo nem um terço, nem um quarto, e nem coisa nenhuma! O tal do fax: fulano foi passar um fax (no banheiro). Ainda bem que quase ninguém mais passa fax. Passa-se e-mail. Daqui uns dias (o fax) será obsoleto até no banheiro.
Ainda têm o “desktop” e o laptop”. Tipos de computador. O primeiro é de mesa, o segundo, de colo. Computador de colo – ops! cuidado com a cacofonia! (com puta dor de colo) –, que, antes de firmar jurisprudência, já virou notebook, livro de bolso (que deveria se chamar computador móvel), mas já está perdendo sua vaga para o netbook, que é o computador de rede. Um expert no assunto me sugeriu: melhor armazenar no “pen drive” (pô, chega de aspas!) para economizar espaço! Não tenho dúvidas de que em breve tempo cada cérebro terá um chip (ou mais) com tanto gibabytes que nos tornaremos meio-robôs ou totalmente. Teremos um tocador de CD, outro de filme, gravadores de CD e de DVD, um word para escrevermos nossas mal tecladas (mentalizadas) linhas, um messenger (telepático) para bater papo, calculadora e um teclado mental. A mente, aliás o chip, cuidará de tudo. Está aí o exemplo na cirurgia cardiológica: inventaram o tal do stent (mola para dilatar as artérias), que resultou no benefício para o cidadão que ganhou uma grande prorrogação de prazo neste planeta. Complicou? É só trocar as molas, isto é, os stents. Tenho um parente que tem tantos stents (molas) que ganhou o apelido de Colchão Ortobom.
Já não bastavam os shopping centers (com seus playgrounds) que vendem hot dog e cheseburger regados a catchup; os pit stop dos McDonalds; o pré-histórico long play (o bisavô do CD); o copyright (que deveria se chamar patente ou direito autoral) dos livros; o ghost write (o escritor fantasma). Carlos Heitor Cony era ghost-write (escrevia discursos para o presidente Juscelino).
Fazer um checkup é se consultar junto ao médico. Mas checkup é mais chique. E chique é palavra francesa – além de carnê (carnet), buquê (bouquet), abajur (abar-jour), crochê (crouchet), filé. Tem gente que, querendo ser mais chique ainda, diz que fez um checkup com médico que se especializou – adivinhe onde? – na França, claro.
A verdade é que estamos perdendo nossa identidade. Daqui a pouco não comeremos bifes e sim hambúrgueres, não teremos goiabada cascão com queijo de Minas e sim sunday de chocolate com chantily. Nem suco de caju e sim coca-cola ou sprite lemon. E aí, brother, teremos pés e peitos imensos (as mulheres, claro), pouca bunda e uma vontade louca de sermos franco-atiradores.


Um comentário:

  1. Passo por aqui para deixar um abraço!
    O Blog está ótimo. Parabéns!
    Alexandre Ernesto.

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