domingo, 28 de junho de 2009

Carta de amor a Otávio

Por Tadeu Nascimento


Querido Otávio,

Você ainda não me conhece, nunca viu o meu rosto, as minhas rugas e não sabe nada das minhas mágoas. Mas saiba que em mim mora um sentimento por você muito nobre, porque é verdadeiro. Que o amor que tenho é imensurável e difícil de se expressar. Sei que não me faço entender, mas um dia, no alto da sua maturidade, haverá de compreender que desde o seu mais minúsculo começo, da notícia da sua existência, o meu coração se encheu de alegria tal qual quando soube que sua mãe estava se formando no ventre da mãe dela, sua avó. Que você seja bem vindo. Que a vida lhe seja generosa. Que seja feliz. Não imagino pra você um futuro de riquezas, de glórias e de poder, mas um futuro de equilíbrio emocional para não se perder nas armadilhas da vida que o dinheiro e o mundo moderno arquitetam, mas que tenha paz, que cumpra o seu destino de educar seus filhos, netos e que os faça entender que a vocação natural do ser humano é o de apenas ser feliz e que a simplicidade é o segredo da nossa existência. Que ame sua mãe, minha filha, por toda vida; cuidando dela principalmente quando a velhice dela chegar.

Que seu pai seja também muito feliz com a sua vinda e que seja o seu parceiro, tal qual Sancho Pança a servir o Dom Quixote com seus sonhos mirabolantes, mas cheios de bondade e de amor a servir a justiça dos homens. Que ele seja melhor do que eu, embora eu me fizesse o tempo todo de Sancho Pança reconheço que deveria fazer mais. Entretanto dei o máximo de mim. E isto é inquestionável. Me fiz herói, me fiz paciente, me fiz mãe, irmão, e até avô antes da hora. Me fiz amigo confidente, me fiz porto seguro, me fiz bom no sentido mais amplo da palavra. Pois bem, que seu pai gaste o máximo do tempo dele com você. Certa vez- já se vão para mais de duas décadas- sua mãe com cinco anos de idade, me gritou “Ô pai, o Wanderson está soltando pum na minha frente!”. Wanderson, tio da sua mãe, era um menino de onze, doze anos. Enquanto os outros tios mais velhos já estavam vivendo suas juventudes nos bares, nos namoros, ele se dedicava a perturbar a paz de sua mãe. Então eu disse pra sua mãe para que relevasse os puns do tio Wanderson, porque ele era o único que estava ali dedicando todo o seu tempo à sua mãezinha ainda tão pequeninha, ao contrário dos outros que se esqueciam dela em prol de outras aventuras...Que, naquele momento, era o único que tinha atenção para com ela. Sua mãe me olhou e o seu olhar ainda insiste em não sair da minha retina. Tenho a certeza que sua mãe aprendeu muito com este episódio. Ah, como era linda sua mãezinha dentro daqueles cinco aninhos!

Que seu pai gaste seus sábados e domingos no Jaó, que ele cante pra você, como eu cantava para sua mãe as canções de Vinicius de Moraes, como “Menininha do meu coração/ Eu só quero você a três palmos do chão...”; que no verão ele brinque com você nas areias da praia e que ele não seja rigoroso quando você esvaziar os bolsos da bermuda dele (quando ele fizer caminhada com sua mãe na praia) para comprar sorvetes, bugigangas e outras bobagens. Que ele peça ao garçom dois, três pratos de camarão para você, mesmo sabendo que depois você poderia passar mal e dar um trabalho daqueles. Que ele tenha toda paciência com você e todo amor que eu tive e tenho por sua mãe. Que ele o leve, quando se tornar rapazinho, mesmo cansado, à meia noite, a ver o show do Cidade Negra (também dos Titãs, Paralamas, Jota Quest) pela enésima vez e voltar a buscá-lo às três da madrugada, mesmo tendo que trabalhar na manhã seguinte.

Ah Otávio, acredito que não fui mal sucedido. Ao contrário. Sabia, desde o início da minha pobre vida que ao final tudo se encaixaria, tudo faria sentido e que os obstáculos, dores, seriam apenas desafios e que eu os venceria, mesmo já com os cabelos encanecidos e sem levar os louros da vitória. Hoje, vejo com clareza que a sua vinda é o que faltava para tecer o fio do meu destino, ou seja, o que daria sentido a minha vida. Sei também, filho de minha filha, que -como dizia o velho professor Clóvis, meu pai- o importante é querer bem as pessoas, o que -perdoa-me o pleonasmo- significa que não se deve guardar ira, ou qualquer sentimento negativo para com o seu semelhante.
Que sua mãezinha o ensine amar os livros, a boa música e todo tipo de arte. Que ela o crie com dignidade e doçura. Porque de sua mãe- tenho certeza, pois a conheço muito bem- qualquer adjetivo de beleza é pouco diante do caráter que ela possui.

O Tempo. Há de se prestar atenção ao tempo. Sei querido Otávio, que talvez não terei o tempo que eu gostaria para vê-lo homem formoso, feliz, pois quando alcançar a maturidade provavelmente eu não estarei mais aqui, mas isto é outra história. O que importa é que mais uma vez quero lhe dizer o quanto você é bem vindo.


Saudades futuras de

Seu avô Tadeu

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