domingo, 14 de junho de 2009




Falemos de paixões, falemos de Vinicius de Moraes

Por Tadeu Nascimento

Um tempo para os fatos políticos. Até porque escrever sobre política é como bater em ferro frio. Falemos de amenidades. Falemos de alegria. Falemos de amor. Aqui, nesta crônica, o amor se confunde com a paixão. E enquanto existir o amor Vinicius estará na moda. Já se foram quase 30 anos que Vinicius se foi. No entanto, parece que ele não se foi. Ele é tão presente tal qual o seu “Que seja infinito enquanto dure”. Ele está por aí, nos bares, nas emissoras de rádio, na boca dos amantes, nos CDs, nos livros, falando de amor. Incorrigível sedutor, Vinicius viveu para as mulheres e para a poesia. Não, não é bem assim. Vinicius vivia paixões. Se entregava por completo. E quando a chama acabava, ele precisava se alimentar novamente de outra paixão. Por isso era incompreendido: mulherengo, devasso, boêmio e por aí vai. Muitas das suas ex-mulheres terminavam por ficar de mal com o poeta. Sua filha Maria foi afastada de Vinicius por ira da mãe ao poeta. E quando ela esteve junto ao pai, a principio ela o viu como ser estranho, disse ela, mas o poder de sedução de Vinicius fez com que ela, em 24 horas se apaixonasse por ele.

“A vida é única e o que importa é vivê-la com paixão.” Vinicius tem histórias que não acabam mais. Poucas pessoas, por exemplo, sabem que ele “cantava” Tônia Carrero todas as vezes que a via e que recentemente a atriz confessou que se arrependeu de não ter dado para o Vinicius (e também para o Juscelino Kubitscheck). Por conta da capacidade de viver novas paixões, conta Tônia Carrero que o sedutor Vinicius quando chegava no “Antônio’s Bar”, reduto de artista e intelectuais, a turma- só para atormentá-lo- cantava em coro (ao ritmo e melodia de “Se esta rua, se esta rua, fosse minha”): “Se eu tivesse, se eu tivesse muitos vícios/ o meu nome, o meu nome era Vinicius/ Se estes vícios fossem muito imorais/ eu seria o Vinicius de Moraes!” Claro, Vinicius ficava “p” da vida. Curiosidade sobre Vinicius: ele é o autor da letra de “O Pau de Arara” (a música é de Carlinhos Lira) eternizado na voz de Ari Toledo. Outra: ele e o Chico Buarque, mudaram a letra original de “Gente Humilde” para a que conhecemos hoje e que até então era só de Garoto (Aníbal Augusto Sardinha) composta em 1945 e que ninguém conhecia. Esta segunda versão portanto passou a ser de Garoto,Vinicius e Chico.

Vinicius para crianças. A sensibilidade do gênio alcança todos os universos do amor: assim como o erudito maestro Heitor Villa-Lobos, abriu espaço na sua criação de Bachianinhas para cantigas de roda para crianças como “Ciranda, Cirandinha”, “Cai, Cai Balão”, “Escravos de Jó”, “O cravo brigou com rosa” e dezenas de outras (nossas professorinhas do grupo não nos ensinaram quem era o compositor destas pérolas, posto que mal sabiam elas quem era Villa-Lobos), Vinicius compôs a “Arca de Noé”, musical para crianças que é uma obra prima: As músicas “O Pato”, “A Casa”, “O Professor de Piano” “O Caderno”, “Menininha do meu coração” hão de ficar para sempre nas bocas das nossas crianças.

Esta semana assisti, pela quinta vez se não me engano, o DVD/documentário Vinicius de Moraes de Miguel Faria Jr, produzido em 2006 e acho que sempre a voltarei a vê-lo. Não dá só para alugá-lo; é como uma bíblia, um Aurélio, vale a pena tê-lo em casa. Com participações de Chico Buarque, Caetano, Gil, Bethânia, Tônia Carrero, Ferreira Goulart, Antônio Cândido e claro, Toquinho. O filme é bonito, engraçado, emocionante (chega-se às lágrimas), e narra outras histórias interessantes do poeta.

Vinicius havia separado do segundo casamento, quando Rubem Braga apresentou a moderna Lila Bôscoli ao poeta: “Vinicius esta é Lila. Lila este é Vinicius. E seja o que Deus quiser!” Lila era linda e inteligente. Eis o seu terceiro casamento. Outra história que resultou também em casamento: o sétimo (Vinicius casou-se nove vezes!): Maria Bethânia conta neste documentário que um dia, em Salvador, ela se encontrou com Vinicius sozinho e muito triste num restaurante. Bethânia apresentou sua amiga Gesse ao poeta. Foi uma reviravolta no semblante do poeta. Ele se encantou com Gesse e já quis casar-se de imediato com ela. “Eu quero me casar com esta moça!” “Estou apaixonado por essa moça, Bethânia!” No outro dia Vinicius leva Gesse para Buenos Aires. Gesse era filha de santo- do candomblé- e o poeta que era ateu deu uma guinada de 180 graus e passou a colocar Oxalá (Deus) nas suas composições e a freqüentar o terreiro da Mãe Menininha de Gantois. E o seu casamento com Gesse foi num terreiro de Iemanjá.

Na abertura do filme uma voz em “off” narra uma crônica de Rubem Braga para Vinicius que havia falecido em 09 de julho de 1980: “Caro Vinicius de Moraes, escrevo-lhe aqui de Ipanema para lhe dar uma notícia grave: a primavera chegou. Você partiu antes. É a primeira primavera de 1913 para cá, sem a sua participação. Seu nome virou nome de rua. E nessa rua que tem seu nome na placa vi ontem três garotas de Ipanema que usavam minissaias. Parece que a moda voltou nesta primavera. Acho que você aprovaria.”

Vinicius retrata muito bem sua personalidade na sua obra que é a eterna capacidade de renascer para uma nova paixão. Chico canta neste documentário “Medo de Amar” autoria de Vinicius: “Vire esta página do livro/ Vê se esquece de mim/ Finja que o amor se acabou/ e se esqueça de mim/ Você não compreendeu que o ciúme é um mal de raiz/ E que ter medo de amar não faz ninguém feliz/ Agora vai sua vida/Como você quer/ Porém não se surpreenda se uma outra mulher/ Nascer em mim/ Como no deserto uma flor /E compreender que o ciúme é o perfume do amor.” Vinicius era assim. E esses versos “porém não se surpreenda se uma outra mulher/ Nascer em mim/ Como no deserto uma flor” são de uma beleza rara, e que nós, simples mortais, gostaríamos de dizer para quem achamos que os mereçam.

No final do documentário Chico conta que certa vez perguntaram ao Vinicius se ele acreditava em reencarnação e o que ele gostaria de ser se houvesse reencarnação- peço desculpas ao leitor, mas é o Chico quem conta no filme: E o Vinicius respondeu: “Eu gostaria de ser do jeito que eu sou, mas com um pau um pouquinho maior”. Hilário.

Compre ou alugue, mas não deixe de ver o DVD Vinicius de Moraes de Miguel Faria Jr.

Tadeu Nascimento é servidor público e advogado


Email: tadeunascimento10@hotmail.com


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